=Posts Recentes

[5]

A soteriologia das Assembleias de Deus


É com imensa alegria e entusiasmo que adquiri um exemplar da tão aguardada Declaração de Fé das Assembleias de Deus. Um documento que visa acabar, de uma vez por todas, com qualquer dúvida que possa existir quanto à interpretação oficial da igreja a respeito dos temas centrais de sua teologia. Por se tratar de uma declaração, é natural que o documento vise atingir os membros da denominação, não tendo a intenção de fazer qualquer tipo de ataque às outras instituições que entendem os temas tratados de forma diversa. 

Os membros das Assembleias de Deus têm agora a responsabilidade de estudar o documento para sanar dúvidas muito comuns em nosso meio e também para saberem discernir quando estiverem diante de um pregador genuíno ou apenas de um mero animador de auditório. Uma leitura atenta da nossa Declaração de fé deixará claro que muitos de nossos famosos "pregadores" não se preocupam em conhecer sequer o básico de nossa doutrina. Atraem as multidões apenas com suas frases de efeito e seus cacoetes que dão certo ar de "espiritualidade". O lançamento da Declaração de Fé é o anúncio de que o tempo desses está se findando. Tenho fé que chegará o dia em que os assembleianos do Brasil conhecerão tão bem a sua doutrina que não haverá mais espaço para meninices em nossos púlpitos.

Agora, tratando do conteúdo da Declaração propriamente dito: ela se posiciona corajosamente em temas que vêm sendo objeto de intenso debate, especialmente nas redes sociais, nos últimos anos. Talvez o mais acalorado deles seja o debate acerca da soteriologia de nossa denominação. Apesar de, na prática, as Assembleias de Deus sempre terem tido certa rejeição ao calvinismo, era muio comum encontrarmos em nosso meio ensinadores que defendiam uma visão semipelagiana da salvação. Com o advento  de documento confessional, o problema está resolvido. As Assembleias de Deus no Brasil são, oficialmente, uma denominação arminiana! e o documento não deixa espaço para qualquer tipo de dúvida com relação a isso.

Citarei aqui alguns trechos* do documento que tornam explícita a aderência aos chamados "5 pontos do Arminianismo":

Comecemos pelo Capítulo IX, que discorre "Sobre o pecado e suas consequências". Nesse capítulo, há um subtópico intitulado "A corrupção total do gênero humano". Nesse trecho, fica evidente que nós defendemos a doutrina da Depravação Total do homem, Vejamos o que diz a Declaração:

"A corrupção total do gênero humano. A Queda no Éden arruinou toda a humanidade tão profundamente que transmitiu a todos os seres humanos a tendência ou inclinação para o pecado. Não somente isso, contaminou toda a humanidade: “não há um justo sequer” (Rm 3.10); “todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3.23). A natureza moral foi corrompida, e o coração humano tornou-se enganoso e perverso. Todas as pessoas estão mortas em ofensas e pecados; são inimigas de Deus e escravas do pecado. A corrupção do gênero humano atingiu o homem em toda a sua composição — corpo, alma e espírito, conforme lemos em Isaías: “Toda a cabeça está enferma, e todo o coração, fraco. Desde a planta do pé até à cabeça não há nele coisa sã” (1.5,6). Isso prejudicou todas as suas faculdades, quais sejam: intelecto, emoção, vontade, consciência, razão e liberdade. Portanto, o homem por si mesmo não consegue voltar-se para Deus sem o auxílio da graça divina. Apesar de tudo, a imagem de Deus no homem não foi aniquilada; foi, no entanto, desfigurada a tal ponto que a sua restauração só é possível em Cristo. Jesus reconheceu algumas qualidades no moço rico e até mesmo nos fariseus. Todos nós conhecemos descrentes que são pessoas de bem, honestas e de bom caráter e religiosas, como o centurião de Cafarnaum, ainda que o bem social que elas praticam leve a marca da contaminação do pecado." p. 100, 101

 No capítulo X que trata especificamente "Sobre a salvação", encontramos os demais pontos da doutrina arminiana. Vejamos:

O capítulo já deixa claro em sua introdução que a salvação é uma opção disponível a todos os homens, mas que é obtida pela Graças, por meio da fé, sendo o homem incapaz de salvar a si mesmo com base apenas em suas obras. Também fica claro o posicionamento favorável à doutrina da Expiação Universal de Cristo:

"CREMOS, professamos e ensinamos que a salvação é o livramento do poder da maldição do pecado, e a restituição do homem à plena comunhão com Deus, a todos os que confessam a Jesus Cristo como seu único Salvador pessoal, precedidos do perdão divino: “A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele creem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome” (At 10.43). Trata-se da restauração do relacionamento do ser humano com Deus por meio de Cristo: “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não lhes imputando os seus pecados” (2 Co 5.19). Somente a fé na morte expiatória de Jesus e o arrependimento podem remir o pecador e levá-lo ao Criador. Essa salvação é um ato da graça soberana de Deus pelo mérito de Jesus Cristo e não vem das obras: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8,9)." p. 109

Em seguida, temos subtópico intitulado "Salvação para todas as pessoas" em que a ideia de uma eleição incondicional é rejeitada enquanto a doutrina da eleição baseada na presciência divina é afirmada. Além disso, fica clara a posição da igreja no que diz respeito à resistibilidade da Graça:

"Salvação para todas as pessoas. Um dia, todos os seres humanos comparecerão diante do Senhor e Criador de todas as coisas. Deus, contudo, não deseja a perdição de ninguém: “que quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade” (1 Tm 2.4). Por isso, o Pai enviou o seu amado Filho Jesus Cristo para morrer em nosso lugar, providenciando-nos uma salvação eterna, completa e eficaz.8 O Evangelho contempla a todos e a ninguém exclui: “Porque a graça de Deus se há manifestado, trazendo salvação a todos os homens” (Tt 2.11). Por conseguinte, a salvação está disponível a todos os que creem. Sim, todos nós, sem exceção, podemos ser salvos através dos méritos de Jesus Cristo, pois todos nós fomos criados à imagem de Deus. O Soberano Deus não predestinou incondicionalmente pessoa alguma à condenação eterna, mas, sim, almeja que todos, arrependendo-se, convertam-se de seus maus caminhos: “Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, em todo lugar, que se arrependam” (At 17.30). A predestinação genuinamente bíblica diz respeito apenas à salvação, sendo condicionada à fé em Cristo Jesus, estando relacionada à presciência de Deus. Portanto, a predestinação dos salvos é precedida pelo conhecimento prévio de Deus daqueles que, diante do chamamento do Evangelho, recebem a Cristo como o seu Salvador pessoal e perseveram até o fim. A predestinação do crente leva-o a ser conforme a imagem de Cristo; assim sendo, todos somos exortados a perseverar até o fim: “aquele que perseverar até ao fim será salvo” (Mt 24.13). A graça de Deus é manifestada salvadoramente maravilhosa, perfeita; entretanto, não é irresistível, pois não são poucos os que, ignorando o Evangelho de Cristo, resistem ao Espírito da graça. A graça divina tanto salva quanto nos preserva a alma neste mundo corrupto e corruptor. A fé antecede a regeneração: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus” (Ef 2.8); “Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado” (Mc 16.16); “Se, com a tua boca, confessares ao Senhor Jesus e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dos mortos, serás salvo” (Rm 10.9)." p. 110, 111
Temos ainda um subtópico denominado "A Graça de Deus" onde o documento firma posição favorável à doutrina da Graça Preveniente, que restaura o arbítrio do homem caído:

"A graça de Deus. Cremos que todos os homens e mulheres foram atingidos pelo pecado a tal ponto que, embora tenham sido feitos à imagem de Deus, não podem, por si mesmos, chegar a Deus. Não há nada que o homem natural possua ou pratique que lhe faça merecida a graça de Deus. A Bíblia ensina: “Não há ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus” (Rm 3.11). A Bíblia qualifica essa condição espiritual como “mortos em pecado” (Cl 2.13) e “mortos em ofensas” (Ef 2.5). A ideia de morte, aqui, é de separação, e não de aniquilamento. Deus derrama sua graça, sem a qual o homem não pode entender as coisas espirituais, ou seja, foi Deus quem tomou a iniciativa na salvação, “do SENHOR vem a salvação” (Jn 2.9), agindo em favor das pessoas.Graça é um favor imerecido. É por meio da graça que Deus capacita o ser humano para que ele responda com fé ao chamado do evangelho: “Mas, se é por graça, já não é pelas obras; de outra maneira, a graça já não é graça” (Rm 11.6). Todavia, os seres humanos, influenciados pela graça que habilita a livre escolha, são livres para escolher: “Se alguém quiser fazer a vontade dele, pela mesma doutrina, conhecerá se ela é de Deus ou se eu falo de mim mesmo” (Jo 7.17). Deus proveu a salvação para todas as pessoas, mas essa salvação aplica-se somente àquelas que creem: “isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que creem” (Rm 3.22). Nesse sentido, não há conflito entre a soberania de Deus e a liberdade humana." p. 113

Por fim, o documento trata com naturalidade a respeito do controvérsia (existente até mesmo entre os arminianos) em torno da possibilidade da perda da salvação. Há inclusive um subtópico com o título "É possível a perda da salvação", em que fica clara a posição das Assembleias de Deus em favor da possibilidade de apostasia (temporária e eterna):
"É possível a perda da salvação. Rejeitamos a afirmação segundo a qual “uma vez salvo, salvo para sempre”, pois entendemos à luz das Sagradas Escrituras que, depois de experimentar o milagre do novo nascimento, o crente tem a responsabilidade de zelar pela manutenção da salvação a ele oferecida gratuitamente: “Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo” (Hb 3.12). Não há dúvidas quanto à possibilidade do salvo perder a salvação, seja temporariamente ou eternamente. Mediante o mau uso do livre arbítrio, o crente pode apostatar da fé, perdendo, então, a sua salvação: “Mas, desviando-se o justo da sua justiça, e cometendo a iniquidade, fazendo conforme todas as abominações que faz o ímpio, porventura viverá? De todas as justiças que tiver feito não se fará memória; na sua transgressão com que transgrediu, e no seu pecado com que pecou, neles morrerá” (Ez 18.24). Finalmente temos a advertência de Paulo aos coríntios: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia” (1 Co 10, 12). Aqui temos mencionada a real possibilidade de uma queda da graça. Assim, cremos que, embora a salvação seja oferecida gratuitamente a todos os homens, uma vez adquirida, deve ser zelada e confirmada." p. 114
Creio que diante das citações acima, não há margem para qualquer suspeita com relação à soteriologia assembleiana. De agora em diante, aqueles que acusarem nossa denominação de ser semipelagiana só o farão por ignorância, e nesse caso caberá a nossos membros explicar a verdade daquilo que cremos, ou por má-fé, caso em que devem ser devidamente alertados ou até mesmo ignorados.

Que Deus abençoe a nossa denominação e que esse despertamento do interesse pela teologia em nosso meio não morra, mas cresça a cada dia.


_______________________________________________________________
*não incluí as notas de rodapé contidas na Declaração

OBS: A Declaração de Fé das Assembleias de Deus possui um preço extremamente acessível e já se encontra à venda nas lojas da CPAD de todo Brasil e também nos links a seguir:

Edição comum (capa simples):Aqui
Edição de luxo (capa dura): Aqui
A soteriologia das Assembleias de Deus A soteriologia das Assembleias de Deus Reviewed by Alcino Júnior on terça-feira, julho 25, 2017 Rating: 5

Nenhum comentário: